terça-feira, 5 de maio de 2020

‘Os surdos têm confiança na solicitude de Deus que os faz seguir adiante’

As paróquias da Arquidiocese do Rio de Janeiro onde existe a Pastoral do Surdo, por meio de seus agentes surdos e intérpretes, desde o início da pandemia e, por sua vez, do distanciamento social, vêm mantendo a dinâmica de evangelização e do “encontro” com a fé, com Deus.

Segundo a intérprete da Basílica Imaculado Coração de Maria, no Méier, Margareth Maria Lessa Gonçalves, que também faz parte da equipe de Coordenação dos Intérpretes do Regional Leste 1, estão sendo realizadas transmissões pelo Facebook ou Youtube de missas com a Língua Brasileira de Sinais (Libras) e elaborados vídeos da liturgia diária e de catequese incorporada à realidade da pandemia e da reza do terço.

“Além da evangelização, os intérpretes têm se esforçado também para atender os surdos no esclarecimento das informações sobre a situação da transmissão e da evolução dos casos de Covid-19, os cuidados com as fake news e ainda sobre os decretos e normas vigentes publicados pelas autoridades sanitárias”, disse.

Uma das paróquias que tem transmitido a missa dominical com a interpretação por meio de Libras é a Paróquia São Francisco Xavier, na Tijuca. A Basílica Imaculado Coração de Maria, no Méier, chegou a transmitir o Tríduo Pascal com o mesmo tipo de interpretação.

De acordo com Margareth Gonçalves, outro modo utilizado foi a interpretação posterior da missa, não ao vivo, na qual o intérprete traduz enquanto assiste a missa e grava em vídeo. Esse recurso em vídeo repassado aos surdos foi usado por um dos intérpretes da Paróquia Bom Jesus da Penha, na Penha.

“Chama a atenção a mobilização dos próprios surdos para sentirem-se unidos em oração, livres do desânimo, para dar testemunho e mostrar a fé que amam e abraçam”, disse.

Margareth Gonçalves acrescentou que os intérpretes têm ajudado na tradução, e podem até participar junto, mas as atividades como catequese, a reza do terço e o estudo e leitura da liturgia têm acontecido por iniciativa e manifestação dos próprios surdos.

Os coordenadores surdos têm ainda motivado seus grupos à participação diária e à disponibilização de links, desde orações, missas ou celebrações do Papa Francisco e de Dom Orani.

“Os surdos estão antenados com toda a Igreja, mesmo quando não há certeza de que haverá interpretação em Libras. Nem todas as celebrações ou eventos transmitidos pelas TVs católicas, apresentam tradução em Libras ou legendas em português. Tudo isso não foi motivo de desestímulo, mas fez os surdos buscarem soluções junto aos intérpretes da pastoral”, disse.

Na opinião de Margareth Gonçalves, esse é o outro lado da quarentena. As dificuldades que vieram com as condições impostas pela pandemia elevaram em mais um nível o isolamento social já vivido há muito tempo.

“Pessoas com deficiência, não só os surdos, já convivem com os efeitos da escassez de recursos e de acessibilidade. Mas, sendo conscientes das dificuldades que excluem, também confiam na graça de Deus que acolhe e propicia alternativas, nas quais acaba gerando solidariedade”, afirmou.
Outro exemplo é o uso obrigatório de máscaras praticado de forma correta pelos surdos, mas que incorpora um empecilho adicional à comunicação já precária com os ouvintes, pois não permite a leitura labial.

“Eles tiveram a ideia de carregar um papel onde gentilmente explicam ser surdos, entendem e aceitam o uso da máscara e pedem para quem precisar falar com eles baixar a máscara ou escrever. Foi o reflexo de quem vive na pele o problema, já que alguns surdos não foram dispensados de seus trabalhos e precisam circular pelas ruas”, enfatizou.

Margareth Gonçalves destacou que toda essa situação está sendo difícil para os surdos, mas certamente eles irão se adaptar a mais essa realidade.

“Os surdos têm confiança na solicitude de Deus que os faz seguir adiante. O Senhor guarda seus filhos e os inspira à presteza. Os surdos conquistam seu espaço social a cada dia, devagar, mas instigados, e aprenderam a seguir adiante, com força e fé”, concluiu.